sexta-feira, 20 de outubro de 2023

Cinema Orly


Saí do espetáculo "Cinema Orly" e pensei:" Que porrada!". Sou hoje mais um alguém encarregada de reverberar as vozes que não foram ouvidas porque " O cinema Orly saiu do cinema Orly. O mundo é o cinema Orly". Duvidam? Vamos aos fatos.
O cinema Orly, cinema pornográfico localizado na Cinelândia, centro da cidade do Rio de Janeiro, frequentado por diversos gays, bissexuais, travestis, inclusive homens casados que, claro, não iam somente assistir uma sessão de cinema, foi também um reduto, um gueto no qual aquelas pessoas podiam viver suas experiências sexuais sem ser incomodadas pela polícia. No seio da sociedade não, lá fora eram logo enquadradas na contravenção penal de vadiagem, mas ali no cinema Orly ninguém as incomodava. O espetáculo não retrata somente o cinema Orly, hoje fechado, mas traz a importante discussão de um tema absolutamente atual, pois as pautas ultraconservadoras estão aí para retirar direitos e tornar uma parcela da sociedade sem voz. 

A ideia do espetáculo surgiu quando o ator Teo Pasquini encontrou o autor do livro Luís Capucho em uma festa e adquiriu deste um exemplar cuja edição já se encontrava esgotada. A dramaturgia foi feita por Gustavo Colombini que não se ateve tão-somente a potente descrição das experiências do autor, frequentador assíduo do Orly, mas pesquisou a época, a sociedade, a política, contextualizando o lugar, dando a importância histórica e libertária necessárias. O resultado é um texto forte, onde a sexualidade está envolta no poder de fala, poder de expressão e poesia.

Diogo Liberano pegou esse texto e dividiu o espectador, colocando alguns perto do ator, perto de seu corpo, de seus movimentos e outros atrás de uma cortina onde é possível só ouvi-lo como se estivessem diante de uma tela de cinema. O diretor propõe dois tipos de sensação ao espectador, uma plateia-corpo e uma plateia-projeção. A direção insere todos dentro do cinema através de marcações que evidenciam os encontros que lá se davam com o personagem principal ou quando nos deparamos com vários frequentadores interpretados pelo ator que ora rasteja como um réptil, roçando o ventre no solo, ora acaricia as poltronas do cinema como se fossem dorsos. A sexualidade, a sensualidade, a solidão são muito bem expostas pela excelente direção.

Teo Pasquini é um ator que não opta pelo lugar-comum, ao contrário, escolhe difíceis e brilhantes caminhos para seu personagem, a começar pela opção de fugir dos estereótipos, apresentando a mais profunda e dolorosa humanidade. Por isto, seu trabalho é tão rico, intenso na expressão corporal, calcado no texto, mas acima de tudo no subtexto construído pelo ator. É explícito sem precisar usar de qualquer gestual óbvio, ao contrário, sua interpretação é visceral, eloquente e poética. Uma interpretação profundamente sensível. Não é preciso ficar nu para se desnudar em cena. A palavra desnuda.

O desenho do espaço assinado por Diogo Liberano nos faz relembrar o que é o verdadeiro Teatro, pois faz uma sugestão, propõe a imaginação e isto é imprescindível. Os objetos cênicos a cargo dele e de Teo Pasquini guardam uma característica em comum, quase todos são fálicos como um desodorante, garrafas de água, lanterna, sapatos masculinos... 

O desenho de luz também de Diogo Liberano e Luiz Paulo Barreto contribui para a sensação de se estar no interior do cinema. Sempre optando pelo tênue.

Por fim, devemos ouvir, reeditar, reescrever, distribuir as vozes que não foram devidamente ouvidas. "Cinema Orly" é um espetáculo para todos e o livro será relançado pela editora Carambaia. Um verdadeiro grito de alerta.


Ficha técnica CINEMA ORLY

A partir do livro homônimo de Luís Capucho
Atuação: Teo Pasquini
Dramaturgia: Gustavo Colombini
Direção: Diogo Liberano
Direção Assistente: Marcela Andrade
Dramaturgismo: Suzana Velasco
Desenho do Espaço: Diogo Liberano
Roupas e Objetos: Diogo Liberano e Teo Pasquini
Desenho de Luz: Diogo Liberano e Luiz Paulo Barreto
Intervenção Sonora: Diogo Liberano e Gustavo Colombini
Preparação Vocal: Lucia Provenzano
Terapia Corporal: Andrêas Gatto
Operação de Luz e Som: Luiz Paulo Barreto
Ilustrações e Cenotécnica: Lucas Chetta
Design Gráfico: Marcio Andrade
Intérprete de LIBRAS: Alex Sandro Lins
Assessoria de Imprensa: Rachel Almeida – Racca Comunicação
Gerenciamento de Redes Sociais: Thaís Barros
Fotos de Divulgação: Thaís Grechi
Assessoria Jurídica: Clarisse Stephan
Captação de Apoios: Bruno Paiva e Danuza Formentini
Produção Executiva: Danuza Formentini
Direção de Produção: Danuza Formentini e Teo Pasquini
Idealização: Teo Pasquini 


Serviço
Temporada de estreia: 05 a 27 de outubro de 2023
Teatro Glaucio Gill: Praça Cardeal Arcoverde, s/nº – Copacabana, CEP: 22040-030, Rio de Janeiro/RJ Dias e horários: quintas e sextas, às 20h
Sessões acessíveis com tradução em LIBRAS: 20 e 27 de outubro, às 20h
Ingressos: R$ 40 (inteira) e R$ 20 (meia-entrada)
Duração: 75 minutos
Lotação: 101 lugares, dos quais 24 lugares são “plateia-corpo” e 77 “plateia-projeção”
Classificação: 18 anos
Venda de ingressos: https://funarj.eleventickets.com/ Telefone da bilheteria: (21) 2332-7904

Segunda Temporada: 02 a 05 de novembro de 2023
Teatro Dulcina: Rua Alcindo Guanabara, 17 - Centro, Rio de Janeiro - RJ
Dias e horários: quinta e sexta, às 19h, sábado, às 15h e às 19h, e domingo, às 15h e 18h.
Sessões acessíveis com tradução em LIBRAS: 4 e 5 de novembro, sábado e domingo, às 15h
Ingressos: R$ 40 (inteira) e R$ 20 (meia-entrada)
Duração: 75 minutos
Lotação: 101 lugares, dos quais 24 lugares são “plateia-corpo” e 77 “plateia-projeção”
Classificação: 18 anos
Venda de ingressos: https://www.sympla.com.br/

Nenhum comentário:

Postar um comentário