sexta-feira, 27 de agosto de 2021

O Cego e O Louco


Recortes da relação de dominação, perversa por vezes e consequentemente submissa, por outro lado, entre dois irmãos que moram juntos, lembranças, ironias, sarcasmo e inseguranças constroem o mosaico que se monta caco por caco para, ao final, chegar a um resultado inimaginável. " O Cego e O Louco" se passa na noite em que os irmãos Nestor e Lázaro convidam a vizinha Lúcia para um chá e na espera por sua chegada se revela a loucura da relação entre os protagonistas, provoca risos e espanto nesta comédia dramática admirável em todos os detalhes.


O texto premiado de incríveis 16 páginas é assinado pela baiana Claudia Barral. Escrito em 2000, somente em 2019 chegou aos palcos no Rio de Janeiro. O espetáculo estreou no Sesc Copacabana com sessões lotadas, cujos ingressos se esgotavam horas antes. A autora faz uma reflexão profunda sobre as relações humanas, sobre a cegueira e a loucura, sobre a arte, sobre destinos que se transformam, sobre a árdua rotina de forma tão bem amarrada, conectando criatividade, humor cítrico e crítico para ao final dar o pulo do gato. Um texto arrebatador!


Os atores Alexandre Lino e Daniel Dias da Silva realmente contracenam, na acepção mais fiel da palavra. Alexandre Lino conduz seu personagem Nestor com muita potência, na voz, nas tresloucadas risadas, exercendo domínio sobre seu irmão sem esboçar qualquer freio. Sua atuação faz de seu personagem Nestor o condutor, a mola propulsora dos conflitos. A dificuldade da cegueira do personagem não aparece em nenhum momento na atuação, ao contrário, tratada de maneira tão natural e aproveitada em nuances gestuais enriquecem o trabalho. Daniel Dias da Silva transparece toda a fragilidade, confusão, insegurança e submissão de seu personagem de maneira comovente. Sua atuação desperta no espectador um sentimento de piedade dada a condição em que Lázaro vive. O ator vai sutilmente revelando a complexidade deste irmão na aceleração e quebras de ritmo de falas e de gestos que demonstram a confusão mental e emocional de seu personagem. Dois gigantes atores em atuações que entram para o seleto rol das inesquecíveis.


A direção de Gustavo Wabner traz todas as atmosferas peculiares a uma relação doentia. Toda a movimentação cênica tem o propósito de ir montando um quebra-cabeça com um desfecho absolutamente inesperado. O diretor alcança com isso o ritmo perfeito para o espetáculo e extrai dos atores atuações intensas. Gustavo Wabner , tendo trabalhado com grandes diretores, apresenta ao espectador uma direção madura e impactante.


O cenário de Sergio Marimba, o figurino de Victor Guedes são fundamentais para o espectador adentrar em todo o contexto da peça, mas vale a pena dar um especial destaque à direção musical de Tibor Fittel. As músicas pontuam as cenas de tal forma que quase são um personagem à parte.


"O Cego e O Louco" merece muitos prêmios, com toda a certeza, mas além disso, merece estar na memória como um grandioso espetáculo.






Serviço:

¨O Cego e O Louco¨ - Presencial e On-Line

Local: Teatro PetraGold

Endereço: Rua Conde Bernadotte, 26 - Leblon

Horário: Quintas, às 19h

Venda de ingressos: www.teatropetragold.com.br

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