Certa vez, Regina Casé disse em entrevista que seus
amigos, marido e filho adoram que ela leia em voz alta, segundo o filho ela faz
isso tão bem que a pessoa entende tudo. Nada mais adequado que seu retorno aos
palcos, após vinte e cinco anos de afastamento, esteja ocorrendo através de um
recital.
“Recital da Onça”, texto de Hermano Vianna e da própria
Regina é costurado a partir de uma brasileira convidada a palestrar em Harvard
sobre nossa literatura, mas para ela não é uma tarefa fácil em razão de seu
medo de aeroportos, da imigração americana e do frio. Através desses temores, o
texto traz muitas possibilidades cômicas, além de apresentar grandes obras
nacionais, já que a personagem tem a difícil missão de escolher o que irá falar
em Cambridge em escassos dez minutos. A plateia, então, é convidada a
participar dessa escolha. Com essa estrutura, o texto tem a dose certa de humor
e de crítica, muito pertinente ao atual momento e a questões enraizadas em
nossa sociedade, bem como a respeito do olhar de muitos estrangeiros sobre nós. Isso sem
falar na grata experiência literária proporcionada pelo espetáculo.
A direção de Estevão Ciavatta e Hamilton Vaz Pereira
coloca a atriz bem perto dos espectadores, mesmo quando não está na plateia e
sim no palco. Esse é um dos grandes acertos da direção, deixá-la ao alcance de
todos seja num número de plateia ou num concurso de samba (muitos espectadores
sobem ao palco e participam), ou mesmo sentada num cantinho lendo um dos
diversos autores. Essa intimidade é fundamental para que a personagem e seus
dilemas sejam abraçados pela plateia.
Tudo na interpretação de Regina Casé soa espontâneo e por
isso mesmo mais engraçado. No monólogo, a atriz parece não fazer esforço seja
no humor, seja na profundidade que imprime à leitura das obras. Tarefa nada
simples, pois passear por atmosferas tão distintas e com resultados muito positivos
somente uma grande atriz alcança. Ela desenvolve sua personagem com a marca que
lhe é característica, a naturalidade. Isso faz com que o público se sinta muito
íntimo de sua personagem e crie uma empatia desde a primeira fala do texto.
Mesmo quando o momento não é de humor, mas de falar sobre o medo. Sem dúvida, o
retorno da atriz aos palcos vem em alto estilo.
O cenário de Luiz Zerbini é funcional, nada está ali por
acaso, os objetos não existem para mostrar apenas um ambiente, mas para compor
vários já que essa é a proposta do espetáculo. O figurino de Claudia Kopke é
adequado, um figurino neutro e que confere liberdade aos movimentos da atriz. A
linda iluminação cria atmosferas leves e
densas em grande sintonia com as diferentes fases da encenação.
O espetáculo chega ao final com Guimarães Rosa: “ Mecê
sabe o que é que onça pensa? Sabe não? Eh, então mecê aprende: onça pensa só
uma coisa – é que tá tudo bonito, bom, bonito, bom, sem esbarrar.” Em “ Recital
da Onça” está tudo lá, tudo bonito e bom!
Teatro Oi Casagrande ( Av. Afrânio de Melo Franco, 290 - Leblon )
Temporada : Até 12 de maio
Horário : Sextas e sábados, às 20h e domingos, às 18h
Ingressos: A partir de R$ 35,00 ( meia )
Classificação: 12 anos

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